As Consequências da Recuperação
As dores de cabeça de David começaram logo antes de nos casarmos. Eram enxaquecas debilitantes – acompanhadas de náuseas e uma necessidade desesperada de um quarto escuro e de um travesseiro sobre sua cabeça. Nós tentamos uma variedade de analgésicos, terapias e dietas. Os médicos pediram tomografias e testes, mas o diagnóstico era sempre o mesmo.
A frequência das enxaquecas do David se intensificou e afetou seu trabalho, suas atividades e seus relacionamentos. Até em feriados, férias, casamentos e mesmo no nascimento de nossos filhos, David ou suportava as dores ou ficava abatido por conta dos analgésicos.
Após cinco anos de busca por soluções, um novo remédio chamado Tramadol foi promissor para nós. Tramadol (Ultram) foi comercializado como uma droga milagrosa: reduzir a dor sem debilitar David. Tramadol ajudou-o a ficar ativo e presente novamente.
Mas não demorou muito para o David desenvolver uma tolerância ao Tramadol. Ele tomava mais e mais pílulas para eliminar uma dor de cabeça. Nosso plano de saúde limitava o número de pílulas autorizadas a cada mês, então voltei a trabalhar para ajudar com os gastos. Muitas pessoas com doenças crônicas adquirem dívidas médicas, pensei.
Todavia, quando o dinheiro ficou tão apertado a ponto de não conseguir comprar mantimentos para nossos filhos, minha paciência acabou. Nós começamos a brigar e eu exigi mudanças. Eu tinha vergonha do meu marido, que era pastor de jovens e professor, mas que parecia não ter autocontrole sobre gastos com sua dor.
Após um ano turbulento de enxaquecas e dívidas crescentes, decidimos que precisávamos de um novo começo. Talvez as enxaquecas fossem uma mensagem de que não estávamos vivendo a vida que deveríamos ter.
Nós nos deslocamos mil milhas para o Dave fazer seminário e continuar sendo pastor. Nós nos mudamos de forma imprudente – com um recém-nascido, sem emprego, sem casa. Ficamos em hospedagens gratuitas (couchsurfing) com uma família de seis, por meses, enquanto ele procurava trabalho. Nós nos envolvemos em um acidente, com perda total de nossa van, dando-lhe um novo motivo para buscar alívio da dor novamente.
Mas nossa mudança tirou minha atenção dos hábitos do meu marido. Eu ensinava nossos filhos em casa, o bebê não dormia, não tínhamos dinheiro. Eu estava completamente focada na sobrevivência. Por mais de um ano, Dave conseguiu esconder de mim sua prática de visitar vários médicos e suas dívidas. Seu trabalho como vendedor, atuando em uma área extensa, tornou isso fácil, e os empréstimos no dia de pagamento viabilizavam uma nova maneira de bancar seu hábito.
Por mais de um ano, Dave conseguiu esconder de mim sua prática de visitar vários médicos e suas dívidas. Seu trabalho como vendedor, atuando em uma área extensa, tornou isso fácil, e os empréstimos no dia de pagamento viabilizavam uma nova maneira de bancar seu hábito.
Dave ainda tinha enxaquecas, e quase todo fim de semana ele se escondia em nosso quarto com um travesseiro sobre a cabeça enquanto eu tentava manter nossos filhos quietos. Mas o que eu pensava serem enxaquecas eram realmente dores de cabeça frequentes de abstinência do Tramadol, quando o remorso se instalava ou o dinheiro acabava e ele não conseguia tomar os comprimidos.
Contudo, com quatro crianças pequenas para cuidar, minha compaixão muitas vezes dava lugar à raiva e à acusação. Ele é irresponsável, é preguiçoso, ele não nos ama, é egoísta, ele está tendo um caso... Quando se atrasava para o trabalho, quando os cheques eram devolvidos, quando ele era pego em uma mentira, eu culpava tudo, menos as pílulas.
Foi a Oprah, de todas as pessoas, que abriu meus olhos para a verdade. Fiquei espantada quando um dos convidados em seu programa de televisão descreveu MEUS problemas conjugais: ausências inexplicáveis, dívidas secretas, mudanças de personalidade... E então sua esposa revelou a verdade: ela estava viciada nos seus analgésicos.
Durante anos, eu tinha atribuído o comportamento de Dave à imaturidade e à irresponsabilidade. O uso de Tramadol era praticamente imperceptível fisicamente – ele nunca parecia “drogado”. Finalmente recorri à Internet para obter respostas. Não pude acreditar no que li sobre o Tramadol. Tão viciante quanto heroína? Eu encontrei a informação na bula e, com certeza, Tramadol era altamente viciante.
Senti alívio e ansiedade de uma só vez. Eu confrontei Dave e ele confessou. Mas eu não tinha experiência com vício. Ele era basicamente uma boa pessoa, então eu pensei que, se ele pudesse reduzir aos poucos, ele poderia ter sucesso. Ajudei-o a diminuir as pílulas, mas não durou muito.
Depois de meses tentando e não conseguindo eliminar o vício de Dave por conta própria, ele perdeu o emprego e eu descobri sua prática de visitar vários médicos. Finalmente, chamei alguém para ajudar e Dave foi para a reabilitação.
Nos 21 dias em que ele esteve fora, uma década de segredos e mentiras se desvendou ao meu redor. Eu considerei pegar as crianças e ir embora. Mas mesmo diante de um futuro incerto, eu teimosamente acreditei que se Dave decidisse desistir das pílulas, nós ficaríamos bem. Quando Dave deixou a reabilitação, foi recomendado que, para continuar sua sobriedade, ele deveria frequentar 90 sessões dos A.A. (Alcoólicos Anônimos) ou N.A. (Narcóticos Anônimos), em 90 dias. Ele tentou grupo após grupo e me disse que simplesmente não se encaixava. Eu ingenuamente concordei. Nada em Dave se assemelhava a um estereótipo de viciado em remédios: professor, pastor de jovens, seminarista. Eu estava pronta para colocar o “vício” no passado.
Meses depois, Dave se tornou diretor de um acampamento e centro de conferências cristão. E seis meses depois, quando as contas começaram a aparecer novamente, descobri que ele estava de volta aos comprimidos.
Eu chorei, implorei e gritei – ele estava colocando seu trabalho em risco. Ele fez promessas, eu o ajudei a se livrar daquilo, e tudo ficou bem por alguns meses até que uma enxaqueca, uma ida ao dentista ou uma temporada estressante de trabalho o mandasse de volta para seu velho hábito. A cada recaída, ele ingeria 30 comprimidos por dia.
Durante nossos anos no acampamento, Dave teve primeiro acesso às nossas correspondências, criou endereços de e-mail particulares, solicitou cartões de crédito secretos e, no final, voltou-se para a compra online do Tramadol.
Você não pode viver com segredos e medo por tanto tempo. Eu estava finalmente com raiva suficiente para partir e desesperada por alguém que me ajudasse. Encontrei essa ajuda e apoio em um programa de recuperação baseado na fé. Com um pequeno grupo de mulheres, deixei de lado medos e raiva que mantive durante anos.
Dave foi para a recuperação também, e pensei que ele estava melhorando. Aprendi a deixar um pouco de lado sua recuperação, recuar e deixá-lo sofrer as consequências. E elas foram devastadoras. Ele teve duas recaídas importantes naquele primeiro ano de recuperação – elas lhe custaram seu emprego, nossa casa, cada centavo que tínhamos e muito mais.
Eu lamentei profundamente e fiquei zangada com a perda de nossa vida no acampamento, e nossos filhos também. Mas nossa vergonha secreta estava finalmente exposta para todos verem. Finalmente, me senti livre. Pela primeira vez, o hábito de manter as aparências saiu do meu controle e fiquei para ver o que aconteceria quando meu marido fosse totalmente responsável por sua própria recuperação. Não mais pegá-lo, protegê-lo ou fazer as coisas por ele.
Nós começamos de novo. Ele arrumou um trabalho de baixo salário, com cartão de ponto (assim, eu sempre sabia onde ele estava), e pelos seis anos seguintes, trabalhou duro para reconstruir sua reputação, nosso casamento, nossa família e nossa vida, tudo na mesma pequena comunidade onde tudo começou. Ele passou a frequentar um grupo de recuperação, onde permanece até hoje. E dois anos atrás, ele se tornou o pastor associado de nossa igreja.
A saída não foi fácil, mas Dave está livre da dependência – e das enxaquecas – há oito anos. Depois de 15 anos de vergonha e segredos, tudo mudou quando eu finalmente pedi ajuda.
Se seu cônjuge tem um vício, você pode compreender os sentimentos de desamparo, raiva e falsas esperanças que experimentei. Você não está sozinho(a) nisso. Se você deixar suas informações abaixo, alguém da nossa equipe entrará em contato com você em breve.
Você não precisa enfrentar isso sozinho. Fale com um mentor, é totalmente confidencial.
Estes problemas podem ser difíceis de enfrentar. Se você está pensando em causar algum dano a sua vida ou a de outra pessoa, por favor leia isso!
Preencha o formulário a seguir para podermos entrar em contato com você.